A fiscalização ambiental, embora constitua importante meio de apuração de infrações e crimes ambientais, não é atividade desempenhada em desacordo com uma série de critérios próprios. Mesmo a mais nobre intenção de proteção ambiental submete-se ao Estado Democrático de Direito. A atuação estatal, por óbvio, carece de previsão legal.
Quanto à segurança jurídica dos empreendimentos agropecuários, a expectativa de que a propriedade seja alvo de ação fiscalizatória suscita uma série de preocupações no imaginário do produtor rural: Devo abrir as porteiras? Quem determinou a ação? Houve decisão judicial? Posso filmar a fiscalização? Devo chamar meu advogado?
Limites legais
A ação dos órgãos de fiscalização estatais encontra limitação nas garantias constitucionais, dentre as quais destacamos aqui a inviolabilidade do domicílio. A Constituição Federal traz, no inciso XI do artigo 5º que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. Na prática, o que isso significa?
Conceito de domicílio
A inviolabilidade de domicílio é direito individual que pode ser afastado apenas em casos excepcionais. As propriedades rurais não são apenas empresas a céu aberto, mas os lares de grande parcela das empresas familiares. Mesmo que não o fosse, o ordenamento jurídico brasileiro, através do Código Civil, adota o conceito da pluralidade domiciliar, compreendendo tanto o aspecto residencial como o profissional.
Importante destacar que a proteção constitucional do domicílio é a regra. Desconsiderá-la, é exceção que deve ser fundamentada. O texto constitucional traz dois requisitos fundamentais: flagrante delito ou determinação judicial. Especificamente quanto à fiscalização ambiental, ausente esses critérios, o agente de fiscalização não pode adentrar propriedade rural sem autorização expressa dos proprietários.
Jurisprudência
As decisões judiciais confirmam este entendimento, absolvendo produtores autuados forçosamente em domicílio pelas autoridades ambientais:
PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME AMBIENTAL. OBSTAR A FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. ART. 69 DA LEI Nº 9.605/98. AUSÊNCIA DE MANDADO JUDICIAL. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE DELITO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. É ilegal a entrada no domicílio do agente quando não há mandado judicial, nem situação de flagrância, sem o consentimento do morador do imóvel. Equipara-se ao domicílio, o local contíguo ao local de trabalho do agente, destinado à sua alimentação e ao seu descanso. A existência de denúncia anônima, no sentido de que no local havia carne de animais silvestres, e de anterior autuação por infração similar, desacompanhados de qualquer outro dado objetivo, constituem indícios insuficientes de flagrante delito, para autorizar o afastamento da proteção constitucional. Absolvição mantida.
(TRF-4 – ACR: 50076179820114047110 RS 5007617-98.2011.404.7110, Relator: MARCELO MALUCELLI, Data de Julgamento: 11/03/2014, SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: D.E. 13/03/2014)
Saídas legais
Os direitos fundamentais não estão sujeitos a um Estado de Direito Ambiental. Antes, todos os entes públicos e suas atividades, a exemplo da fiscalização ambiental, devem estar em consonância com o Estado Democrático de Direito. O exercício do poder de polícia ambiental não é prerrogativa que se sobrepõe indiscriminadamente aos direitos fundamentais. A garantia de que as atividades fiscalizadoras aconteçam de maneira democrática, segura e eficiente, está atrelada à ordem legal expressa, sob pena de caracterizar violações de direitos.
Orientamos, em todos os eventos similares, que sejam tomadas as medidas preventivas através das ouvidorias dos órgãos competentes, registro de ocorrência junto às autoridades policiais e socorro judicial conforme as particularidades de cada caso concreto.
Veja também:
8 – Limites da fiscalização ambiental
7 – Fui autuado em uma fiscalização ambiental, como devo proceder?
Acesse a Ouvidoria do IBAMA em:
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/Portaria/PRT/Portaria%20n%C2%BA%20826-20-mma-ibama.htm
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