Fogo em área rural: aprenda a documentar acidentes com segurança jurídica e evite multas e sanções ambientais por queimadas ilegais e incêndios.
Queimadas e incêndio: entenda a diferença
O uso de fogo é técnica tradicional, culturalmente reconhecida e amplamente utilizada no manejo de pastagens e uso da terra em atividades agropecuárias. A nova Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, instituida pela Lei nº 14.944 de 31 de julho de 2024 traz este reconhecimento e faz uma importante distinção entre técnica agrícola e eventos acidentais:
Art. 2º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:
I – incêndio florestal: qualquer fogo não controlado e não planejado que incida sobre florestas e demais formas de vegetação, nativa ou plantada, em áreas rurais e que, independentemente da fonte de ignição, exija resposta;
II – queima controlada: uso planejado, monitorado e controlado do fogo, realizado para fins agrossilvipastoris em áreas determinadas e sob condições específicas;
III – queima prescrita: uso planejado, monitorado e controlado do fogo, realizado para fins de conservação, de pesquisa ou de manejo em áreas determinadas e sob condições específicas, com objetivos predefinidos em plano de manejo integrado do fogo;
A prática legal da técnica está condicionada à autorização do órgão ambiental competente. O documento, emitido pelas secretarias estaduais de meio ambiente, traz a discriminação do uso e finalidade da queima controlada, as coordenadas do perímetro autorizado e o período de vigência para exercício da licença. Quando realizada sem autorização, fora do plano de manejo estabelecido ou durante o período proibitivo, a prática de queimada em área rural configura crime e infração ambiental.
As confusões conceituais entre queimadas e incêndios são frequentes, nas mídias e socialmente. Considerar que todo evento ou acidente com fogo em área rural corresponde à prática de queimadas ilegais, contribui para a injusta criminalização do produtor rural e aumento da isnegurança jurídica no campo.
No esquema abaixo, procuramos trazer de maneira didática esta diferenciação e possíveis implicações:
Período proibitivo do uso de fogo: inovações para o ano 2024
De forma inovadora, os Decretos de instituição do período proibitivo de uso de fogo em área rural estabeleceram intervalos distintos conforme a localização e particularidades climáticas de cada bioma. Em Mato Grosso, o período proibitivo de uso de fogo no campo está vigente de 1º de julho a 30 de novembro para os biomas Amazônia e Cerrado e de 17 de junho a 31 de dezembro para o bioma Pantanal, conforme Decreto nº. 827/2024 e Decreto nº. 927/2024, editados no ano corrente.
Neste intervalo, o uso do fogo é autorizado apenas para as práticas de prevenção e combate a incêndios realizados por intituições públicas e as autorizações de queima controlada são suspensas neste período.
Nos demais estados, a instituição do período proibitivo segue regramento próprio, editado pelos respectivos governos locais.
Riscos jurídicos do fogo: fiscalização ambiental
As atividades de fiscalização ambiental se intensificam no período de seca, especialmente pelos prejuízos ambientais que são aumentados pelas condições climáticas adversas. Dados comparativos publicados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) apontam que o ano de 2024 apresenta aumento de 101% de focos de calor, em comparação ao ano anterior.
Em área rural, caso o órgão ambiental entenda que a ocorrência de fogo tem natureza intencional e criminosa, os respectivos proprietários estão sujeitos a lavratura de Auto de Infração ambiental e aplicação de sanções como multas, apreensões e embargos. As multas aplicadas são estipuladas a partir de R$ 1.000,00 por hectare ou fração, alcançando valores entre R$ 5.000,00 a R$ 50.000.000,00, a depender do caso concreto. Na esfera criminal, há possibilidade de aplicação de pena de reclusão, de dois a quatro anos.
A atribuição de responsabilidade ambiental é automática, com instrução processual baseada em ferramentas de sensoriamento remoto: as coordenadas geográficas das áreas atingidas por fogo são sobrepostas às bases de dados dos órgãos ambientais. Assim, o Cadastro Ambiental Rural incidente sobre a área degradada rende ao proprietário (CPF ou CNPJ indicado em cadastro) a abertura de processo administrativo e a imputação de sanções.
Esse modelo de atuação é elogiado pelos órgãos ambientais e Ministérios Públicos pela alegada eficiência na detecção de danos ambientais, mas peca gravemente na falta de comprovação de autoria e responsabilidades, gerando violações de direitos ao setor produtivo.
Em Mato Grosso, apenas as autuações realizadas pelo Corpo de Bombeiros Militar no primeiro quadrimestre de 2024 somam mais de R$ 21 milhões em multas aplicadas, conforme divulgado pela instituição.
Novos riscos comerciais e contratuais: agenda climática
Atualmente, questões ambientais relacionadas à produção agropecuária permeiam diversos acordos comerciais de teor socioambiental, a exemplo dos já conhecidos acordos Moratória da Soja e Compromisso Público da Pecuária. As regras atuais relacionadas ao Crédito Rural também trazem delimitações ambientais relevantes, chegando alguns casos (desmatamento ilegal, embargo de áreas rurais e pendências no licenciamento) a render impedimento de acesso a linhas de financiamento.
Do fomento da atividade agropecuária à venda da produção, a existência de passivos ambientais podem engessar as negociações rurais. Soma-se ao rol de parceiros comerciais, as relações travadas entre proprietários, parceiros e arrendatários. Nesse cenário, as delimitações contratuais precisam de previsões claras quanto às obrigações de vigilância, responsabilidade e mitigação de riscos ambientais, especialmente quanto ao fogo.
A chamada agenda climática já é uma tônica presente não só nas discussões internacionais mas também iniciadas no âmbito dos órgãos ambientais, a exemplo dos estados do Pará e Mato Grosso, cujas secretarias especializadas apresentam um trabalho ostensivo em prol da chamada “economia de baixo carbono”, a despeito dos impactos financeiros e produtivos e das imprecisões das propostas.
Agindo em relação ao fogo: antes, durante e depois
Propriedades rurais precisam comprovar a adoção de medidas preventivas e corretivas em relação ao fogo.
Reunimos abaixo as orientações já publicadas em artigos anteriores. O objetivo é que os produtores rurais não só evitem o cometimento de infrações, como saibam documentar com segurança jurídica eventuais incêndios em suas propriedades.
O afastamento de responsabilidades ambientais só é possível através da construção de provas.
Entrevista concedida ao programa Planeta Campo
Confira a seguir a entrevista concedida pela advogada Rebeca Youssef ao programa Planeta Campo.
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